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Do ‘Ainda Não’ ao Ser Concretizado: Reflexões Ontológicas sobre a Assunção de Maria

No dia 27 de agosto, transmiti em meu site uma pequena aula sobre o tema da Assunção de Maria ao Céu em corpo e alma, por ocasião dos 75 anos da Proclamação do Dogma da Assunção, realizada em 1º de novembro de 1950 pelo Venerável Papa Pio XII.


Pode parecer assunto de menor importância, mas é preciso verificar a conexão entre a realidade revelada da Assunção de Maria e a ontologia envolta em nossa realidade existencial.



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Não percebo outra realidade a ser considerada senão a compreensão metafísica de ato e potência, que desde Aristóteles, consolidando-se mais em Tomás de Aquino, consegue mostrar com maior clareza o movimento do “ainda não” para a realidade concretizada. De maneira analógica podemos considerar a realidade sobrenatural da assunção de um ser humano em corpo e alma como concretização deste movimento que existe em potência no “ainda não” da existência humana. Esta compreensão transforma a verdade da assunção de Maria em uma apavorante demonstração de mínima existência do humano consciente neste e deste mundo, e nos faz refletir, meio que atordoados, sobre a realidade além do que conhecemos, além do que apalpamos, comprovando nossa factual realidade transitória por esta realidade corruptível e acidental. 


Percebamos que na assunção, um ser humano da mesma matéria que você e eu transcendeu a esta realidade que conhecemos, que ultrapassou qualquer limite entre o existente e o eterno, concretizando o “ainda não” de uma matéria direcionada a uma finalidade. O que percebemos na “transformação” da existência de Maria é o que aparentemente seria a finalidade de qualquer indivíduo composto de mesma matéria que o indivíduo Maria, e isto quer dizer ser migrado ou transformado em uma existência diferente ontologicamente da que conhecemos de nós mesmos. Parece que esta transformação não anula e nem prejudica a consciência deste indivíduo, visto que podemos chamar Maria, mesmo após sua assunção aos céus, ou transformação existencial, de Maria, a mãe de Jesus e esposa de José. Ontologicamente isto também nos afirma uma compreensão que já trazemos desde os antigos, de que nossa consciência não morre, não se extingue com a materialidade do corpo, mas acompanha a eternidade da alma[1], algo que nos deveria fazer entender a elevada natureza que compõe nossa individualidade, visto que, se podemos dizer que temos algo em comum com cada indivíduo deste mundo, certamente é somente a matéria que naturalmente é corruptível e acidental, e que por isso não deveria ser motivo de elevação ao eternamente singular, isto é, a consciência individual. 


Mesmo que a assunção de Maria sempre apareça como tema meramente religioso, este movimento não deveria ser considerado extraordinário, isto em vista do que já tentamos expôr aqui, de que a finalidade de nossa existência é a elevação qualitativa a uma realidade eterna, em que nossa manifestação existencial corresponderá a manifestação do próprio sustentador da realidade em si. Ainda pode parecer tema restrito a crença para uma mente desdenhosa do desenvolvimento que desde Platão temos tido acerca da eternidade do ser humano em sua profunda existência. Saber que Maria foi e está elevada qualitativamente a realidade primeira e sustentadora desta nossa realidade transitória, não somente nos deveria alegrar como motivar ao despojo de qualquer exaltação do que perecerá, do que sendo transitório não pode realizar a existência eterna imersa no sustentador de nossa realidade. 


O que desejei mostrar na aula que ministrei em vídeo foi exclusivamente a excelência do indivíduo Maria, que como eleita por Deus tornou-se a primeira e a prova de nossa plenitude para além desta matéria visível e corruptível.

[1] No Fédon de Platão (particularmente nas seções 64c–69e e 106–107), Sócrates argumenta que a alma, sendo simples e não composta, não pode ser destruída como o corpo. Ela, portanto, acompanha a eternidade e participa do mundo das Ideias, sendo a sede da verdadeira consciência. Plotino (séc. III d.C.), no Enéadas, afirma a eternidade da alma, que não se identifica plenamente com o corpo, mas com o Intelecto e o Uno. A alma permanece viva e consciente mesmo após a morte, retornando à sua origem.

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