A tolice disfarçada no meio intelectual
Nem todo o intelectual irá produzir bibliotecas de conteúdo original. Aliás, a própria pretensão à originalidade já é uma tolice. (Diário, 23/05/2022)
Uma espécie de consenso subliminar parece ter sido criado entre os acadêmicos e estudiosos, uma espécie de necessária produção visível para justificar a pretensa pecha de “intelectual”. Este sentimento gera aos poucos uma ansiedade sufocadora em muitas mentes que poderiam inflamar ainda mais seu brilhantismo se não se sentissem pressionados por esta força oculta que os cobra uma produção extensa e se possível, original.
Como registrei em meu diário, a pretensão de originalidade em qualquer trabalho intelectual, já é uma tolice neste meio. Parece realmente impossível admitir que todo ser humano dedicado aos estudos e a produção literária, precise elaborar uma teoria original para que se reconheça sua capacidade e qualidade nas reflexões. Este mundo alucinado em que se vive, onde se deseja enquadrar as atividades de um intelectual dentro de uma produção em série, é a própria ação contrária à evolução racional, algo que depõe contra a pretensa intenção que clareia-se como um verdadeiro tiro no próprio pé.
Até aqui, parece que nego a existência de qualquer originalidade no conjunto das produções que podemos conhecer. Mas não é bem assim. O que nego a pretensa originalidade em tudo e a necessidade de produção volumosa para um reconhecimento no meio acadêmico e social. De fato, as próprias reflexões que muitos estudiosos elaboram podem trazer certa dose de originalidade quanto ao método de abordagem ou mesmo detalhes de aplicação, apesar de que o centro do conteúdo sempre poderá ser remetido a outro pensador do passado, que já havia abordado tal tema, seja de maneira extensa e explícita, seja de maneira sintética e talvez subentendida.
Ser ou não ser original? É sobre este questionamento posto como régula que identifico a tolice que ainda permeia e muitas orienta decisivamente não só a sociedade, mas os próprios grupos editoriais e acadêmicos.
Um candidato a intelectual na verdade, nem deve se preocupar em ser chamado de intelectual, muitos menos de receber títulos e honrarias por conta de certa produção, mas um investigador honesto e sincero consigo mesmo e com o que estuda, saberá que a realização pessoal está no silêncio e nas horas de leitura e escrita que ocupam boa parte de seu tempo. Tempo onde a ansiedade pelo reconhecimento não deve passar de uma drosófila a ser “espanada” com a mão, como um pensamento ridículo e sem sentido.